
O uso do crack, meus amigos leitores, é considerado com uma espécie de fim de linha no trajeto da dependência química, reforçando ainda mais o preconceito contra quem consome essa droga, que por muito tempo foi associada exclusivamente à população de rua e moradores da periferia. Hoje vemos que as coisas já não são mais assim, o crack já atingiu as classes média e alta. Todos estão sujeitos ao crack, basta ter a primeira vez. Pesquisadores, usuários (eu, o autor) e traficantes ressaltam este aspecto do vício, que pode se configurar como uma agravante para a recuperação. Posso afirmar, com pleno conhecimento de causa, que o usuário se sente totalmente marginalizado, excluído.
Os próprios jovens mesmo, em geral, são muito preconceituosos e contribuem para isolar o adolescente que usa crack, que se descontrola e rapidamente se torna dependente, isolado em seu mundo. E isso não contribui para que ele peça ajuda, socorro. Isso apenas faz com que a pessoa se isole cada vez mais, aumentando sua relação de dependência com a droga. Digo isso por experiência própria, fui dependente por três anos e consumia muito crack. Infelizmente, amigos leitores, eu tenho pontos de vista que vários pesquisadores jamais terão. Conheço o efeito real do crack, já escutei a pedra “estralando” no cachimbo quando se põe fogo e traga, já queimei os dedos e os lábios inúmeras vezes. Já senti o “baque” da onda, aquele barulho que vem dentro da cabeça quando se segura a fumaça tragada, a “nóia”, a mania de perseguição, já ouvi vozes, tive delírios. Já passei dias acordado e sem comer, só fumando.
Os próprios traficantes, por muito tempo, resistiram a comercializar o crack por acharem que ele destruía rapidamente a saúde e, também, pela imagem dos usuários. O dependente de crack é considerado uma pessoa sem valores, no qual não se pode confiar. Todos acham que você rouba até a mãe! Bom, amigos, roubar eu nunca roubei. Pelo menos esse ínfimo sinal de dignidade eu consegui manter, mas confesso que foram várias as tentações.
O “Boca”, um traficante pequeno, pai de família e carroceiro que vendia a droga pra completar a renda, segundo ele, me disse uma vez: _"O usuário de crack não tem valor, ele rouba a mãe, ele te rouba. Se você for traficante, ele vai te roubar. Só você deixar guardado e sair dali. Se ele souber que está lá, ele vai pegar. Ele é o famoso banho. Ele dá o banho no cara, é liso, ligeiro"
Sempre jogam na cara de quem usa crack, chamam de pedrinha, de tijolo. Você fica humilhado e mal tratado. O crack é uma droga que não permite partilhar com outro amigo, como a maconha que se fuma em “galera”. Esse isolamento agrava e muito a dependência. A droga passa a suprir essa carência afetiva.
Entre os usuários, de outras drogas, de classe média, o crack está diretamente associado à criminalidade. Quem usa drogas (maconha, cocaína, sintéticas) tem preconceito contra quem usa merla e crack. É taxado (“tirado” na gíria do usuário) como “nóia” e ligado à marginalização.
Claro que o vício pode levar usuários a criminalidade. Sempre em busca de conseguir mais droga, o viciado acaba cometendo roubo, assalto e até homicídio. Mas antes da droga, era uma pessoa boa, um pai de família, um estudante. Os usuários podem sim se tornarem bandidos e perigosos. Mas saibam, amigos, que a maioria é honesta. Sei bem o que digo. A maioria sim é honesta, alguns trabalham braçalmente o dia todo, sob um sol escaldante, e fazendo apenas uma refeição simplesmente pra ter R$ 5,00 pra fumar uma pedra “à noitinha, depois do trampo”. Os usuários de crack têm futuro, basta que haja consciência e tratamento de qualidade acessível.
Afinal são pouquíssimo que podem se dar ao luxo de pagar cerca R$ 5 000,00 ao mês, por uma boa clínica particular.
Uma boa notícia é que o nosso governo parece estar acordando para o fato. No Rio de Janeiro já há uma mudança radical no atendimento público aos jovens usuários de crack, com desdobramentos também nas cidades vizinhas. A assistência social vai a casa dos viciados para combater o crack.
“Nós temos 40 Centros de Referência da Assistência Social (Cras), cada um com quatro assistentes sociais, espalhados pelo Rio, com a expectativa de criar mais 10 até setembro. A partir de agora, eles visitarão as casas de quem procurar ajuda, porque o crack é uma droga que com certeza leva à morte e seu consumo cresce de maneira avassaladora”, disse o secretário municipal de Assistência Social, Fernando William.
Fernando William disse ainda que na maioria dos casos, o viciado sabe o que o aguarda e quer deixar o crack, mas se sente impotente. Os familiares precisam do apoio e do acompanhamento em todo o processo de recuperação. “A crise de abstinência do viciado em crack é muito violenta para ser tratada dentro de casa, em situação de vulnerabilidade ou risco. Por isto a presença do Estado é essencial não só nesta primeira etapa, a do tratamento químico, mas também em todo om processo de recuperação do viciado”, concluiu.
Os Cras atendem a população em situação de vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação e ou fragilização de vínculos afetivos-relacionais e discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências, entre outras. Outra instância do Sistema Único de Assistência Social é o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), num total de nove na cidade do Rio de Janeiro. O Creas é responsável pela oferta de atenções especializadas de apoio, orientação e acompanhamento a pessoas e famílias com membros em situação de ameaça ou violação de direitos.
O governo federal, por meio dos ministérios da Saúde e da Justiça, liberou recentemente R$ 114 milhões para conter o avanço do crack no país, sobretudo nas duas cidades mais populosas, onde existem “cracolândias” há bastante tempo: São Paulo e Rio de Janeiro. Esta verba emergencial será empregada ao longo do ano no tratamento dos usuários, a partir da aquisição de remédios, mas também no acompanhamento psicológico e na terapia de apoio que consolidam a recuperação.
Escrito por Mim, Vencedor
Fontes: Três anos de vício em crack
http://www.agenciabrasil.gov.br
http://www.jornaldamidia.com.br
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